quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Caro,

O jazz é interminável, e isso é ao mesmo tempo maravilhoso e angustiante. Há, de fato, a delícia de saber que existe sempre algo novo a ser descoberto. Mas há a sensação de que morrerei sem ter ouvido nem um milésimo de tudo que há de bom para ouvir. Paul Desmond, por exemplo, não conheço o suficiente para comentar muito além de sua associação com Dave Brubeck. Também tenho um ótimo disco dele com Gerry Mulligan, sax barítono, chamado Two of a Mind. Mas, do pouco que conheço de sua parceria com Jim Hall, gosto, evidentemente. A verdade é que, convenhamos, não há como não adorar de Desmond, com seu estilo suave, limpo, altamente melódico, mas sempre articulado, com algo a dizer.

Hall, você deve saber, foi o principal responsável por tirar Desmond de uma aposentadoria precoce -- após a dissolução do quarteto de Brubeck, quando o saxofonista tinha pouco mais de 40 anos --, convidando-o para tocar em um clube de Nova York. Brincando, Desmond dizia que só aceitou o trabalho porque morava perto e podia sair da cama e ir direto trabalhar. E ele bem podia se dar ao luxo de desdenhar, mesmo: os direitos autorais por Take Five lhe deram uma vida confortável até o fim de seus dias.

Não tenho comprado CDs, mas, como repórter que trabalhou muito tempo com música (e, de certa forma, continua na área), acabo recebendo uma coisa ou outra. Enquanto escrevo, daqui da redação, chegaram Amor Festa Devoção, o ao vivo de Maria Bethânia, baseado nos discos Tua e Encanteria, e Capoeira de Besouro, de Paulo César Pinheiro. Ambos me interessam, o que é raro, considerando a qualidade do que chega. 

O último que comprei foi um de Sonny Rollins ao vivo no Village Vanguard, com dois takes de A Night in Tunisia -- mostrando que duas sessões de um show de jazz, mesmo com repertórios idênticos, jamais serão iguais. Ainda mais quando o homem em questão é Sonny Rollins (um dos meus pé-na-cova, que vi tocar num TIM Festival recente). E você, lembra qual foi o último que comprou?

Em tempo: esqueça tudo que te indiquei até hoje e procure Ah Hum, de Mingus. Não precisa comprar na loja, como faziam nossos avós -- você saberá dar outro jeito.

Juízo,

R.M.T.

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