sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Fernandix, guerreiro,

Teria que pensar um pouco para fazer uma listinha dessas. O que me lembro, de cara, é do primeiro disco não infantil que ganhei: We Are the World. Sim, aquele dos artistas contra a fome na África, precursor desses festivais beneficentes que a gente vê por aí hoje. Puta sucesso na época. E, de alguma forma, um típico one hit wonder, já que nenhuma outra canção do disco vingou. Me lembro que a música tocou no rádio do carro onde estávamos eu, meu pai e minha irmã. E eu comecei a, digamos, cantar -- num embromation louco, já que eu conhecia a melodia, mas não sabia a letra. Até hoje não sei se meu pai ficou encantado ou com peninha. Mas o fato é que me deu o LP. O disco não vinha com a letra, e segui cantando no embromation. Rárá. Já o primeiro disco que comprei, com dinheirinho juntado de mesada, foi All the Best!, coletânea de hits do Paul McCartney. Acho que comecei bem.

Entre os discos de jazz, aí sim, acho mais fácil apontar os que me abriram a cabeça. Ou pelo menos os primeiros a me abrir a cabeça, os introdutórios. Kind of Blue, sem dúvida. Em uma matéria que fiz pra Piauí, acho que você leu, entrevistei rapidamente Jimmy Cobb, o baterista do álbum. Liguei para a casa dele, me atendeu uma mulher, que presumo ter sido a senhora Cobb. Gaguejante, perguntei se mr. Cobb estava em casa. Ele me atendeu gentilmente, e tivemos um papo curto. No final, perguntei para ele por que, entre tantos discos revolucionários de jazz, calhou de Kind of Blue ser o mais expressivo, o mais famoso. Ao que ele me respondeu: "Se eu soubesse a resposta pra isso, poderia morrer hoje." É o único disco que tenho em várias versões: o CD simples; o CD comemorativo de 50 anos com um documentário em DVD; e a caixa comemorativa de 50 anos do disco, com CD, fotos e até um vinil.

Bird and Diz, de Charlie Parker e Dizzy Gillespie, me apresentou para valer à energia do bebop, pelo que sou gratíssimo, porque acabou sendo a minha porta de entrada para todo o resto. At Newport 1956, o disco ao vivo de Duke Ellington no festival de Newport, me introduziu ao mundo do Duque (e das grandes orquestras) em um momento em que eu estava empenhado em devorar bebop -- isso sem falar no estupendo solo do saxofonista Paul Gonsalves, em Diminuendo and Crescendo in Blue, com seus 27 choruses. Time Out, de Dave Brubeck, me fez prestar mais atenção no lado estudado, mas nem por isso menos festivo do jazz. Empyrean Isles, de Herbie Hancock, por conta da faixa Cantaloupe Island, regravada em um hit hiperultramegaestourado pelo grupo US3, me fez ver que o jazz não é um "que", mas um "como". The Complete Ella Fitzgerald & Louis Armstrong, coletânea de tudo que ambos fizeram juntos na Verve, bem... é Louis e Ella, não preciso dizer mais nada. E há John Coltrane, com Giant Steps. E Billie Holiday, com Lady in Satin. E Charles Mingus, com Mingus Ah Hum -- que, enquanto escrevo, coloquei pra tocar no iPod, e Better Git It In Your Soul desce com toda a sua potência. Conhece, nêgo? Se não, conheça.

Qualquer dia conto como comecei a gostar de jazz. Agora, esta correspondência já se faz longa.

Bração (e vote consciente),

Rafaelix, carregador de menires.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Rafaellus,

A sua resposta para a Gadu foi realmente boa. Quase me convencendo. Logo eu, um fã de versões inusitadas. Aliás, um fã das versões, num modo geral, não sou dos puristas. Eu tive uma namorada, beatlemaníaca, que não podia ouvir uma versão para os fab four. Logo eles, que têm muita coisa revisitada por aí, em todos os estilos, de todas as formas, muitas ótimas. Marvin Gaye com Yesterday, Nina Simone com Here Comes the Sun, para ficar com duas, que vieram à mente, ao acaso.

Sim, Lucy Woodward bateu bem, muito bem. De início, aquela guitarrinha que abre Ragdoll é irresistível, assim como a ginga sexy de Lucy, que dá direção ao álbum. Mulheres que conseguem colocar esse charme no canto merecem atenção, e muito mais. Too Much to Live For também é ótima.

Isso de coisas da pré-adolescência, que continuam nos acompanhando, me leva a um dos últimos posts lá no Som Imaginário. Comecei a falar dos 15 álbuns que, de alguma forma, foram marcos na minha linha do tempo. O primeiro foi... Iron Maiden, lá em 97.

Já parou para pensar nos seus?

Não são os melhores, mas aqueles que marcam algo, marcam mudanças. Deixo aqui os meus, embaralhados, sem ordem de chegada.

Vamos lá, enquanto pensa por aí.

Milton Nascimento & Lô Borges, Clube da Esquina
João Gilberto, Chega de Saudade
Michael Jackson, Thriller
Metallica, Metallica (aka Black Album)
Iron Maiden, Fear of the Dark
Dream Theater, Awake
Nina Simone, High Priestess of Soul
Miles Davis, Kind of Blue
Rolling Stones, Exile on Main St
Led Zeppelin, Houses of the Holy
Peter Gabriel, So
Moacir Santos, Coisas
Queen, A Night at the Opera
The Beatles, Abbey Road
Pain of Salvation, The Perfect Element

Um abraço,

Fernão da Costa

sábado, 23 de outubro de 2010

Franz Ferdinand,

Não sei como seria um show da Amy. Mas pagaria para ver -- acho que seria apenas uma questão de, se ela descesse do palco, não ficar muito próximo, para não levar um murro nas fuças... O que me lembra Lauryn Hill, não pelo soco na cara, mas pelos shows erráticos que fez aqui no Brasil. Seu disco Miseducation of Lauryn Hill é ótimo, e eu sempre quis vê-la no palco. Da primeira vez que veio, há alguns anos, foi o caos: atraso inaceitável, postura basbaque, acessos de estrelismo. Por sorte, acabei não indo. Da segunda vez, este ano, quase fui, mas tive um imprevisto em cima da hora. Depois, soube que o show tinha sido menos pior, mas, ainda assim, muito ruim, com Lauryn fazendo um esforço gigantesco para fazer o que ela chamava de "cantar". Melhor ficar nos discos, em certos casos.

A sua pergunta sobre Maria Gadú é fácil de responder: vale tudo, sim. Desde que benfeito (horrível escrever isso pelo Novo Acordo Ortográfico...). Posso ser franco? Hoje, acho a versão que Maria Gadú fez para Baba a coisa mais interessante daquele disco. Antes uma Kelly Key melhorada do que um Milton Nascimento piorado -- que é o que provavelmente ela faria se regravasse Milton. Afinal, Ben L'Oncle Soul não pode gravar Barbie Girl, do Aqua? Maria Bethânia não pode gravar É o Amor, de Zezé di Camargo e Luciano?

Sobre as babas, não me entenda mal. Eu adoro muitas. Mas alguém, falando sobre comida, certa vez disse que aquilo que você gostou até a pré-adolescência vai continuar gostando até morrer. Acho que o mesmo vale para música. O que pra mim não desce são babas ouvidas depois que virei burro velho. No meu iPod, por exemplo, tem Duran Duran, tem até (céus!) Jon Secada!

Continuo ouvindo Lucy Woodward obsessivamente. Mas tive que comprar outro fone -- o que tinha, comprado numa loja da Apple, chique de doer, ficou com o áudio do lado esquerdo mudo. Maldito Steve Jobs e suas quinquilharias. E você, o que achou de Lucy?

Bom fim de semana,

Rafael, tartaruga ninja.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Professor,

Sim, o Maxwell é baba se comparado aos outros que estamos estudando. Na hora que coloquei no texto, atentei para o detalhe. Mas ele é ótimo. Mesmo. Eu tenho uma queda pelas coisas baba, admito, sempre tive, até o Bon Jovi toca no meu som. Mas antes de sair fora do Maxwell, pedirei só que escute duas músicas: Bad Habits e Phoenix Rise. Respectivamente, abertura e encerramento do último álbum. Na primeira, preste atenção em como a música evolui com os sopros e o arranjo. Mas sim, concordo, novamente, ele se aproxima de uma onda açucarada.

Como será um show da Amy hoje em dia? Não sei. Fico com um pé atrás. Mas tudo indica que teremos algo mesmo em janeiro. Ela já confirmou, parece. E o Mayer Hawthorne um tempo atrás colocou no twitter que vinha para o Brasil. Tudo aponta para um festival de soul. E seria um presente.

E ainda no soul tem o último do John Legend com auxílio luxuoso do grupo The Roots. Acabou de sair e tira o Legend de seus cds melosos e medianos para deixá-lo à vontade no território da black music com covers lado B. É o Get Up, confira. A banda The Roots tem pressão e o punch, que você disse faltar a Maxwell.

Aliás, essa coisa de baba, me lembrou de um episódio recente com Maria Gadu. Esbarrei com ela numa festa, já na madruga, e, depois de elogiar o disco de estreia, perguntei o motivo de gravar Baba Baby, da Kelly Key. Perguntei numa boa, mas acho que ela não gostou muito, claro. Ironicamente, a festa era na casa de Milton Nascimento, um daqueles gigantes...

E que é fã dela.

Kelly Key não dá. O que você acha? Vale de tudo nesse mundo?

Saludos,

Ferdinando

ps.: fico devendo uma lista dos pé-na cova. Por enquanto, Morricone e Lonnie Smith. Na verdade, acho que não foram muitos. Dos seus, queria muito ter visto Bacharach, Wayne Shorter e Aznavour.

ps.: vou atrás da cantora que indicou. Principalmente depois dessa descrição de jazzy, bluesy, sexy, broadway, trilha. Gosto de quando a coisa fica meio mega. Ali no limite.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Véio,

Não conheço Morricone como gostaria. Esse concerto dele aqui no Rio, não faz muito tempo, era um que eu gostaria de ter ido. Era a chance de conferir seu trabalho ao vivo, de ver o homem -- que não deve voltar ao Brasil. O mesmo vale para Paul McCartney, que, ao que tudo indica, vou perder, mesmo. Daqueles mitos que já passaram há muito dos 70, vieram ao Brasil e muito provavelmente não voltarão, fico feliz de ter visto alguns: Burt Bacharach, Charles Aznavour, B.B. King, Sonny Rollins, Wayne Shorter, Kurt Masur... Até que a listinha não faz feio. Qual é a sua listinha dos pé-na-cova?

Maxwell eu já havia escutado uma coisa ou outra, e não havia me fisgado. Sei lá, me soava como um Andrew Lloyd Webber da black music. Lendo a sua correspondência, fui atrás dele no YouTube, e meio que confirmei minhas primeiras impressões. É baba demais pros meus ouvidos. O cara é quase um branco! Não digo que não tenha talento. É um problema de repertório, na minha opinião. Será que estou ouvindo as faixas certas? Falta punch. Sharon Jones é outro naipe, tem aquela coisa negroide que pulsa. Assim como Amy Winehouse, uma das melhores coisas que a música pop revelou nos últimos anos. Se estragou horrores, é difícil ver uma carreira a ser seguida ali (só se a carreira for de pó...). Mas quem sabe? Parece que ela vem ao Brasil em janeiro. Soube, de fonte altamente fidedigna, que viria com Mayer Hawthorne.

Baixei hoje Lucy Woodward, cantora. Não conhecia nada. Está em seu terceiro disco, Hooked!, o primeiro pela Verve -- o que é, por si só, um sinal de qualidade, considerando a gravadora que é. Foi este que eu dounloudeei. Não escutei seus primeiros discos, mas parece, pelo que li, que seguiam numa seara mais pop. O que sei é que este desce que é uma beleza. Tem uma coisa meio jazzy, meio musical da Broadway, meio cabaré, meio bluesy, meio sexy (procure a capa para ter uma noção), meio trilha sonora, sem parecer esquizofrênico, manja? Ragdoll, a primeira faixa, que toca neste momento nos fones, me pegou de jeito. Além do que, a moça é uma graça. Look for Lucy e diga-me o que acha. Dá pra escutar tudo no site oficial dela.

Fui,

Tex-Mex

PS: maneiríssimo o livro do Dahmer. Valeu mesmo.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Boyle,

Uma pena ter perdido a Jazz Orchestra na última segunda-feira. Meu pai ligou dizendo que havia sido uma apresentação ótima e até melhor que o Mayfield, mas aí é coisa de quem acaba de sair de um show, ainda na vibe, você sabe, dê um desconto. Aproveitando: vou registrar aqui a constante busca - ainda sem sucesso - pela composição de Irvin Mayfield para o pai, que vimos no Municipal. Não há como não ter aquela música em casa, no ipod, no celular, onde for. Sem registro dela, não dá pra ficar. Quem achar, avisa.

Já ouvi falar muito dessa trilha de Miles, não tenho, mas me lembrou uma que gosto muito - composta também por ele, em parceria com o Marcus Miller -, a de Siesta, filme de 87, que nem vi, mas achei o LP num desse sebos e bateu bem, viajante. O mundo das trilhas me fascina, vou te dizer, sobretudo, aquelas grandiosas, orquestradas...

Ennio Morricone é um dos que está no meu santuário. Quando lembro do concerto no Municipal uns anos atrás, parece mentira. Foi num festival chamado Música em Cena, que não vi outras edições acontecerem, o que é uma pena, pois tinha uma proposta muito interessante, de filme + música. Mas Ennio é grande, daqueles gennios. Ontem mesmo vi, pela décima vez, Era Uma Vez no Oeste, obra-prima de Sergio Leone, que tem pérolas muito inspiradas por Ennio.

Ah... o novo soul, estamos ficando escolados. Meu tocador - não, sem iPod, ainda não colaboro com a receita de Steve Jobs - também está negro. Mayer Hawthorne, Raphael Saadiq, Ben L'Oncle Soul, estamos juntos nesse grande elenco. Fui atrás da sua dica do Aloe Blacc e, meu caro, gostei muito. Está soando muito bem. I Need a Dollar é de deixar no repeat - você também tem essa mania?

Na mesma praia, ando ouvindo Sharon Jones & The Dap Kings. Uma super cantora de soul, já com seus 50 e poucos anos, mas que foi descoberta há pouco tempo. A banda dela foi emprestada para o Back to Black, de Amy. Vale. Outro que sempre ouvi é o Maxwell. O primeiro álbum, Urban Hang Suite, é espetacular, rebobina aquela coisa Marvin Gaye com muita classe.

Vá atrás de Maxwell, veja o que esse cara faz com a voz em seu MTV Unplugged. O último, da volta dele pro mercado, Black Summer's Night, também é imperdível. Assim como os outros, valoriza muito a coisa da voz, do canto, como você tem destacado. Eu, baixista que já fui um dia - hoje os instrumentos são mais decorativos -, sempre tive uma queda fortíssima pela black music.

Grande abraço,

J Brown

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Nobre,

Cats foi chato. Huumm... Me corrijo: Cats é chato. Acho que esgotei minha cota de Andrew Lloyd Webber. Quando vi O Fantasma da Ópera, anos atrás, achei um barato, grandioso, magnânimo e tals. Hoje, com alguns musicais nas costas (não muitos, hein!), relembro e a única coisa que me inspira é um bocejo. No caso de Cats, é uma pena, porque é muito talento direcionado para uma coisa... chata. O elenco canta e dança que é uma barbaridade. A direção de cena é impecável, o cenário é luxuoso, a iluminação é precisa. O que não funciona é o que antecede tudo isso, ou seja... Andrew Lloyd Webber. A história é inexistente, as músicas são banais. Pfui... Mas, o que se há de fazer?, o musical está em cartaz há quase 30 anos. Alguém vai me apedrejar já, já, por dizer essas barbaridades. Miau!

Jazz Orchestra of the Concertgebouw foi ducaralho, com todo o ensemble que faltou a Irvin Mayfield (questão de estilo, não de melhor ou pior). Tocaram até Ivan Lins no bis. Pena que você não pôde ir.

Você me pergunta sobre trilhas de filmes. Não sou um pesquisador, não conheço nada a fundo -- o que é uma pena, porque há compositores soberbos nesta área --, mas gosto de algumas coisas. Uma grande trilha que roda de vez em quando no iPod é a de Ascensor para o Cadafalso, ótimo suspense de Louis Malle. A música é de Miles Davis, que a gravou com músicos franceses e com o baterista Kenny Clarke. Mas a que roda mais é a de A Firma, outro bom suspense, estrelado por Tom Cruise (talvez o último realmente bom filme feito por ele). O disco intercala músicas incidentais (dispensáveis) com faixas apenas com o piano de Dave Grusin.

Falei em iPod, e o meu anda negro como as asas da graúna. Ben L'Oncle Soul, que você me apresentou, rola sempre. Raphael Saadiq, Mayer Hawthorne também. Na semana passada, descobri Aloe Blacc. Manja? Segue na linha dos citados, bebendo forte nos heróis do soul e do rhythm and blues. Me fisgou, embora não saiba se na mesma medida que L'Oncle Soul, por exemplo. O que me chama a atenção, independentemente disso, é a onda vintage em que esses caras surfam -- inclusive nos vídeos, busque algo do Aloe Blacc no Youtube para entender o que estou dizendo. A música negra americana chegou a uma encruzilhada nos últimos anos em que o caminho era fazer babas de amor que matariam qualquer diabético ou fazer cara de mau, deixar o elástico da cueca aparecendo e recitar proibidões. Pombas, esses caras, L'Oncle Soul, Saadiq, Hawthorne, Blacc, todos eles cantam! Sabe lá o que é isso, hoje em dia?

Susan Boyle te manda um beijo,

Rafael, candidato ao America's Got Talent

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Comandante,

Macca garantido, ainda bem. Será histórico.

Usar sensacional para Lloyd Webber pode ser um reflexo do meu perfil iniciante no mundo dos musicais. Ok, ficamos com o muito legal. Sim, é farofa, é brega, All I Ask of You é a confirmação disso. Conheço Stephen Sondheim apenas de nome, mas vou atrás.

Vamos lá, o Air é um dup pop francês com pé no eletrônico, nas viagens progressivas do passado, nas trilhas sonoras e até em algo... new age. É interessante, é envolvente. Tem a coisa da música de clima, que traz algo mais viajante mesmo, fica no ar. Por enquanto estou no Moon Safari, de 98, o mais badalado deles, e no Talkie Walkie, de 2004, disco que tem a pérola que citei na carta anterior, Alone in Kyoto, que foi trilha de Encontros e Desencontros, filme com Bill Murray e a - bela - Scarlett Johansson.

Como foi Cats?

Você perguntou dos musicais e agora é minha vez: e as trilhas de filmes?

Grande abraço,

Ferdinando

ps.: acabo de pescar um recado, na caixa postal do celular, de meu pai dizendo que está com ingressos para Jazz Orchestra of Concertgebouw, hoje.

sábado, 16 de outubro de 2010

Queridão,

Já gostei mais de Maria Gadú. Mas o excesso de exposição lhe foi pernicioso. E logo com Shimabalaiê, que é a música mais sem graça do disco. Lembro-me que isso aconteceu com Sozinho, composição de Peninha cantada por... Caetano Veloso (e eis que voltamos ao homem!). Era ligar o rádio e: "Às vezes no silêncio da noite..." Abrir a geladeira e: "... eu fico imaginando nós dois..." Tirar o telefone do gancho e: "... eu fico ali sonhando acordado..." Aaaaaaaaarrrrgh. Não há apreço pela música que resista a isso. Comecei a pegar uma certa birra que se estendeu para o resto do disco. Nunca mais escutei. Talvez seja um bom momento de soprar a poeira do disquinho e colocar pra rodar. Quanto às comparações com Cássia, hum... há uma semelhança, mas eu não diria que há um parentesco. É tão semelhante quanto, sei lá, Capital Inicial e Barão Vermelho podem ser semelhantes. A verdade é que nego começa a traçar paralelos porque as duas põem (no caso de Cássia, punha, no passado) banca de homenzinho.

Respondendo à sua pergunta rapidamente: não conheço nada de Air. O que me diz?

Conheci The Bad Plus num show no (lamentavelmente) extinto Mistura Fina. Dei a sorte de vê-los duas vezes: uma em sua formação tradicional, apenas com Reid Anderson (baixo), Ethan Iverson (piano) e David King (bateria), e outra com a adição de uma cantora muito peculiar, Wendy Lewis. Recomendo a audição, mas aviso logo: não é música para colocar para tocar e sair para cozinhar ou para ler jornal. Ponha para tocar alto e deite no chão. Ou meta um fone nas orelhas. Comece por Prog, disco que tem covers de Everybody Wants to Rule the World, do Tears for Fears, Life on Mars?, do David Bowie, e Tom Sawyer, do... Rush, de que você tanto gosta. Passe para For All I Care, o álbum no qual eles contam com a participação de Wendy Lewis. Atenção para a altamente lisérgica versão de Confortably Numb, do Pink Floyd. Desculpe se cito apenas os covers. Mas é a melhor maneira de ser fisgado para o mundo do The Bad Plus, para suas composições próprias. Aliás, vejo no site oficial que eles estão lançando o primeiro disco só com músicas originais. Ueba.

Do biscoito fino do experimentalismo para Andrew Lloyd Webber, que, sinto discordar, não é sensacional. É a farofa da Broadway, o Bon Jovi dos musicais. O que não significa que não possa ser legal. Pode, e muito. O Fantasma da Ópera é legal. Mas sensacional é um adjetivo que eu reservaria a Stephen Sondheim, por exemplo. Você viu Gypsy? Se não, e se estiver em São Paulo nos próximos dias, vá ver. Se não estiver em São Paulo, baixe a trilha sonora de uma das versões estrangeiras. Escute Rosie's Turn, a apoteótica música que encerra o espetáculo. E depois conversamos.

Ainda falando sobre musicais, na semana passada bateu na minha caixa de e-mails o release de Hair, nova produção de Charles Möeller e Claudio Botelho. Estreia dia 5. Estou ansiosíssimo para ouvir "this is the dawning of the age of Aquarius, the age of aquariuuuuuuuuus!" O que esses caras fizeram pelos musicais no Brasil não tem preço. Soube que Botelho fez, ao mesmo tempo (!), as versões de Hair e de Mamma Mia!, que vai estrear em São Paulo. É muito peito. E o pior (melhor, na verdade) é que provavelmente saiu bom. É o melhor versionista em atividade hoje no país. Poderia ser cabotino e dizer que falta concorrência, aí é fácil, mas acho que ele seria mesmo com mais gente no ramo.

Hoje verei Cats. Na segunda, verei os holandeses da Jazz Orchestra of the Concertgebouw. Trago impressões.

Garantiu seu ingresso pro Macca? Eu perdi.

Bração,

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

R,

Relendo as últimas correspondências cheguei à conclusão de que foi legal Rush e Caetano figurando no mesmo post, sabia? Os dois, através da reinvenção, acabaram se tornando constantemente relevantes ao longo das décadas. Como você bem disse - e imagino que sim - a reinvenção de Caê vem de sempre e não só dos dois últimos. Assim como o Rush, que foi recriando seu próprio estilo e está aí, até hoje, lotando lugares enormes por onde passa, enquanto muitos contemporâneos do estilo estão falidos e velhos.

Cranberries não me pega, mas reconheço que há algo ali, principalmente nas que citou.

Mas, então, os musicais. Surfo, sim, me interesso, mas ainda como um iniciante, que comprou a prancha há pouco tempo. Gosto das coisas que envolvem um musical, principalmente a figura do compositor e o cuidado com músicas e arranjos, isso me conquista. Sem contar que Lloyd Webber é sensacional.

Fale do The Bad Plus. Sempre leio algo sobre eles, mas nunca cheguei a ouvir. Hoje o Air passou pelo Circo, gosta? Acho Alone in Kyoto uma pérola. Queria ter ido, mas daqui a pouco, à meia-noite, entro na briga por um ingresso do Macca.

No som, agora, entra Maria Gadú com coisas de sua ótima estreia. Ultimamente venho pensando que Gadú, por conta de sua Shimbalaiê tocando massivamente numa novela das 8, tenha, sem querer, entrado para o rol dos "chatos". Vejo gente por aí etiquetando sua música como chata, mas provavelmente sem escutar. Sem contar as associações equivocadas, na minha opinião, com Cássia Eller.

O que acha?

Abração,

F

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Neuma,

Sei que você não perguntou, mas digo que, entre Chico e Caetano, fico com o segundo. Dos dois, é o que sempre me intrigou e segue me intrigando musicalmente. Reinventando-se, como você disse -- e isso não é privilégio de seus dois últimos discos. Ouça Transa ou Livro, dois de seus melhores trabalhos, o primeiro de 1972 e o segundo de 1997, para entender o que estou dizendo. Ou Circuladô, de preferência o ao vivo, com o auxílio luxuoso de Jaques Morelenbaum.

Sobre sua avaliação de que a Banda Cê é "preguiçosa" ou "desleixada", discordo, mas compreendo que ela evoque isso. Roqueiro não gosta do rock de Caetano. Conheço um fanático por metal (não, não vou dizer quem é) que acha Pedro Sá uma farsa como guitarrista. Não digo que seja o seu caso. E não é, juro, aquele papinho babaca de "você não tem ouvido para entender Caetano", longe de mim. Mas é a impressão que tenho: quem gosta do bom e velho róquenrol tende a não ter saco para essa onda roqueira do baiano.

Você fala de Rush, e... você me amaldiçoaria se eu dissesse que meu conhecimento (e, para ser franco contigo, meu interesse) por Rush se resume a Tom Sawyer? E, mesmo assim, por causa do MacGyver...  Aliás, falando em Tom Sawyer, procure a versão lisergicamente jazzística do trio The Bad Plus, conhecido por seus covers jazzy de hits como Everybody Wants to Rule the World, Smells Like Teen Spirit e Heart of Glass. Falo mais sobre a banda na próxima correspondência, se te interessar.

Ontem fui ver Cranberries. Dolores O'Riordan rulez, não é assim que dizem? Banda azeitada à beça, cheia de hits -- Linger, Ode to my Family, Salvation, Zombie. Ali pela meiuca do show, eles passeiam por algumas canções menos conhecidas, e o show dá uma ligeira esfriada no que diz respeito à resposta do público. Mas eles seguram a peteca legal. Bela apresentação.

Devo ver Cats, o musical de Andrew Lloyd Webber, no fim de semana. Taí algo que nunca soube: musical da Broadway está entre as ondas que você surfa? Eu tinha interesse zero, mas fui convertido por minha mulher. Se ela fosse roqueira, talvez hoje eu gostasse de Rush.

Abrá,

Raphael O'Riordan

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Meu amigo, Rafael Teixeira, essa pergunta não se faz.

Mas, hoje, fico com Chico e elimino Caetano. Sou um pouco distante de Caetano (ainda). Sempre tive uma relação mais forte com os mineiros do Clube, depois cheguei na Bossa Nova. Caetano e Gil, só pra colocar os dois aí juntos, ainda chegam a mim pelas coisas básicas. Nunca fui a fundo, por isso minha escolha. Agora, reconheço, sim, quando você diz da relevância de Caetano. Acho que ele, realmente, é o que desperta ainda muitas reações e opiniões quando lança - ou fala - algo. Mais do que qualquer outro artista brasileiro.

Confesso a você, meu caro, que, mesmo sendo do rock de carteirinha, não levo fé nessa onda dele. É boa mesmo? Sei que é muito elogiada, isso eu sei. Mas quando ouvi aquela faixa Rocks, achei ruim. Ali, de primeira, depois não voltei mais.

Aqui dei uma pausa no texto, fui ao youtube e assisti ao video, que continua sem me pegar. Aquele baixista gosta mesmo de estar ali no palco? Tenho minhas dúvidas.

Alguma coisa não me agrada nesses músicos. Talvez o fato de me remeterem a um rock que não gosto, de execução meio preguiçosa, desleixada, não sei bem. Eu gosto do rock bem tocado, rico, e com toques de virtuosismo quando a música pede. Acho que há uma necessidade de elogiar essa turma da Banda Cê. Eles fazem parte da Do Amor, não é? E um dia desses na televisão, Nina Becker tocava uma música de sofrer também com eles de banda de apoio.

Mas voltando a Caetano...

Valorizo a reinvenção, acima de tudo. Vejo a nova fase de Caetano positiva por esse aspecto da novidade, de sair da zona confortável, de se colocar num formato banda e mudar o som, fazer uma coisa com vida nova. Sim, esse ponto é totalmente a favor. E ninguém tira dele. Que outros poderiam fazer o mesmo? A renovação de Caetano vale. E tenho curiosidade de ver o show.

A coisa do rock bem tocado - e também da reinvenção - me leva, inevitavelmente, ao show de domingo passado, quando Rush deu uma aula de música na apoteose. São três - Geddy Lee, Alex Lifeson e Neil Peart -, mas fazem um som de muitos, você deve saber. Geddy usa e abusa de teclados e toca baixo como ninguém, beirando o fusion, e, em muitos momentos, com os pés aciona efeitos, baixos programados etc. Neil apareceu já na década de 70 como um dos maiores bateristas do rock e ainda é.

Pausa para uma curiosidade: Neil, na década de 90, com décadas de Rush nas costas e nada mais para provar, resolveu que deveria voltar a estudar e foi fazer isso com Freddie Gruber. Não é sensacional? Hoje, em seus solos ao vivo, há espaço para uma jam com uma big band de jazz já pré-programada, no melhor clima Gene Krupa e Buddy Rich -- recomendo uma navegada no youtube atrás dessas coisas, você que é do jazz.

Alex Lifeson, que completa o trio, é único. Sabe muito bem como ser um guitarrista de mão cheia e equilibra bem a balança sonora com os outros dois monstros. O Rush faz o uso perfeito da virtuose, que é sempre a favor, sempre para a música, sem exibicionismo gratuito.

E aí você olha para os lados e tem alguém fazendo aquela virada de bateria ou aquele groove de baixo ou imitando aquela voz aguda do Geddy. É bonito de se ver.

Um abração,

Ferdinando Nóimaier

sábado, 9 de outubro de 2010

Neumayer, meu chapa, senta que lá vem história.

Gotan Project foi hipnotizante. O trio titular, você sabe, tem Philippe Cohen-Solal nas guitarras e programações, Eduardo Makaroff no violão e Christoph H. Mueller nas programações (Mueller, em alguns momentos, ficava brincando com um joystick de Nintendo Wii. Acho que era só onda, não servia para nada). Com eles no palco, um pianista, uma violinista, um bandoneonista e uma cantora lindíssima, que googando descobri ser Claudia Pannone, argentina. Procure. Afora mexer com a libido masculina, canta bem -- e, o mais importante, sua voz se encaixa na sonoridade do Gotan, se integra a ela, algo como o timbre de Dolores O'Riordan para o som do Cranberries (aliás, verei-os na próxima terça, mas isso é outra história).

Um telão no fundo exibia vídeos, muitas vezes entre o onírico e o surrealista. Em alguns momentos, as imagens interagiam brilhantemente com a música, como quando uma dupla de rappers no vídeo cantava, escoltados pelo som que vinha do palco. O visual, aliás, era duca, com luzes meio floydianas, como que se comunicando com a música, mas sem exageros, quase minimalistas. No fim, Claudia convocou a plateia a ficar de pé e se aproximar do palco para dançar (aquele momento em que quem pagou uma nota pela pista VIP, justamente para ter a melhor visibilidade, se emputece...). Foi atendida, e deram até um segundo bis.

Mas o que me impressionou mesmo foi Caetano Veloso, ontem, no último (e ótimo) show da turnê de zii e zie. Quando Caê virou Mick Jagger? Em que momento isso se deu? Ou será que ele sempre foi, e eu é que não percebi? O mundo devia estar lá ontem -- acho que só não tinha mais gente porque Bon Jovi e Dave Matthews Band tocavam no mesmo dia. Filas homéricas na porta. Noventa por cento gente por volta dos 35 anos, gente que ainda fazia cocô nas fraldas ou sequer era um projeto de ser humano quando Caetano perguntou, aos berros, se "é isso que é a juventude que quer tomar o poder".

Hoje, ele faz passinhos meio Beck e dancinhas meio Deborah Colker -- quem viu ele cantando Objeto Não Identificado sabe do que estou falando. Faz mash-up de Billie Jean e Eleanor Rigby. Toca para plateias que cantam, em altos brados, desde canções como Irene, absolutamente desconhecida e periférica na obra de Caetano, até Odeio, do último disco, quando ele se associou aos jovens Pedro Sá, Ricardo Dias Gomes e Marcelo Callado, passando pelos hits incontestáveis.

Isso não é uma crítica da minha parte. É uma constatação, apenas. Com todas as bobagens eventualmente proferidas, acho Caetano relevante pra cacete, na música e para além dela. Pode não ser o melhor. Mas talvez seja o mais relevante, entende? Há uma expectativa em torno do próximo disco de Caetano (qualquer que seja este próximo, estou falando também dos discos anteriores, quando eles então seriam os próximos), como creio não haver em torno de nenhum outro artista brasileiro. Me interessa saber o que ele faz ou o que ele acha. As pessoas querem saber. Nem que seja para falar mal e para dizer que Caetano é um idiota.

Certa vez, fui desafiado por um amigo a uma escolha aparentemente inviável: sob a mira de uma arma, quem você escolheria para ser eliminado da história da música brasileira? Chico Buarque ou Caetano Veloso? E você, Fernando Neumayer? Quem você escolheria? Porque aqui, com diziam naquele programa, o final... você decide.

Um abraço caetânico,

Yo.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Meu caro,

Sim, você me convenceu com a questão da Ivete. Foi tudo no ponto e, mesmo que eu ainda ache meio mico tudo isso, foi certeiro. Sim, coerente com o crescimento da artista e toda essa coisa que a envolve. E continuo a concordar com a sua carta. Certamente a questão para o meu pai foi o mood, esperou uma coisa e viu outra. Sem contar que não é por dentro do trabalho de Mehldau, mas gostou independente do piano solo em quase duas horas.

Tenho implicância com o Vitor Araújo justamente pela questão do personagem vir antes do artista. Camisa surrada+calça jeans+all star+um repertório que passa por Chico e Radiohead.

Não é muito pronto isso?

Aliás, logo Chico e Radiohead, que considero artistas âncoras para quem quer mostrar/traçar uma personalidade. Ouvir Radiohead faz fulano cool. Chico também. Juntar os dois parece jogada de mestre. Não falo aqui da música deles - quem sou eu? -, mas algumas coisas assim me distanciam de um artista. O Radiohead, no caso. E este povo todo que aaama Chico, escuta mesmo Chico? Tenho um pé atrás com isso.

Estou ranzinza, reclamão, é melhor você falar do Gotan Project de ontem. Como foi?

No fim de semana, tem Rush. Vou trazer impressões, já que a música aqui é além das fronteiras.

Abração,

Fernando, el roquero

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Saudações, Neumayer,

Não sei se foi uma bola fora esse show da Ivete nos istêites. Depende de quem você considera que chutou a bola. Deu falatório, matéria na imprensa. Muita matéria. Gerou -- como é que eles dizem, mesmo? -- mídia. Vai sair um DVD, se não me engano, que vai vender à beça, pode estar certo. Acho coerente com a trajetória da Ivete, a coroação de um percurso espetacular (no sentido de "espetáculo", de "espetaculoso", digamos assim -- os trios elétricos, as multidões, a adoração dos fãs, as campanhas publicitárias, a perseguição dos paparazzi, os shows com dezenas de trocas de figurino). Você fala em "reconhecimento quase forjado". Bem, talvez seja. A pergunta é: quem se importa? Certamente não aquelas milhares de pessoas que entupiram o lugar. Escreva o que eu vou dizer: o que será lembrado, no futuro, é que Ivete Sangalo está no panteão dos artistas brasileiros que se apresentaram no Madison Square Garden. No que diz respeito à manobra, foi perfeito.

Brad Mehldau deve ter sido soberbo, mas entendo o seu pai. Às vezes, um show simplesmente ótimo captura melhor do que um show soberbo. Não sei se é a questão do piano solo. Rufus Wainwright fez um show de piano solo arrebatador na Sala Cecíla Meireles em 2008. Acho que é uma questão de mood, como diriam os gringos.

Vitor Araujo, conheço pouco. Mas é talentoso, quem negará? Mas talvez -- ênfase no talvez -- seja o tal do soberbo que não me captura. Não sei. E talvez tenha se apegado ao personagem que criaram para ele, o prodígio adolescente do piano que toca de All Star no Municipal e mistura Villa-Lobos com Radiohead. Tenho uma certa birra com esses personagens que antecedem a música que fazem.

Racionalizei muito, não? Prometo que a próxima correspondência será mais visceral. Música é alma, pombas.

Hoje, verei Gotan Project. É só o que toca nas ruas de Buenos Aires, muito mais do que tango tradicional. Gosto à beça. Y usted?

Em tempo: entrevistei Ney Matogrosso, mas não posso contar muito antes que a matéria saia. Só digo o seguinte: o cara é magnético até no sofá, à paisana.

Bração,

Rafael, el tanguero

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Rafael,

Verdade isso que você disse sobre o Mario Adnet. O fato dele ser responsável por bons trabalhos, além dos que faz com grandes nomes, já é motivo para certa visibilidade. Sou um exemplo de uma pessoa que desconhece sua obra. Minha relação com Mario é, apenas, através das coisas de Moacir.

Sim, sabemos que a visibilidade de uma Ivete é mesmo absurda, mas você tocou no assunto do show dela no Madison Square Garden e estava pensando nisso um tempo atrás. Achei uma bola fora. Não tenho qualquer ligação com sua música, mas não vejo nada de positivo em colocar um bando de brasileiros da grande maçã e redondezas num show lá, além dos vips da Globo e voos fretados daqui. Sinceramente, é um reconhecimento calculado, quase forjado, não? Ou estou falando besteira?

A meu ver, foi um show para brasileiros. Sim, no tal lugar que já recebeu artistas consagrados e blá blá blá. Não me convenceu. É diferente de um show aclamado pelo público local. Tem algo aí. Concordas? Não coloco aqui a música dela em questão, mas, sim, a manobra.

Não fui ver Mehldau, perdi. Meu pai, fã de jazz, foi e não curtiu tanto. Assim, gostou muito, mas achou longo e cansativo em alguns momentos. E eu entendo o ponto dele. Foi achando que seria um trio e assistiu 1h40 de piano solo. Sem contar que, de certa forma, o Irvin Mayfield ainda ecoava em sua cabeça, certamente. Fiquei sabendo que Mehldau tocou Martha, do primeiro de Tom Waits, dias antes, em SP. Deve ter sido especial.

Mehldau e seu repertório - a coisa de visitar Soundgarden, por exemplo - me lembra Vitor Araujo, aquele pianista jovem, que segue pelo mesmo caminho de reler seguidamente Chico e Radiohead. E fora isso, comporta-se como o Jamie Cullum, batucando no piano, ficando em pé no banco, vestido igual! Como se juntasse o repertório de Mehldau ao comportamento de Cullum. Venderam essa "originalidade" de Vitor na época. É meio enganar, não?

Abração,

F

domingo, 3 de outubro de 2010

Ave, Neumayer,

Como você bem colocou, a questão do reconhecimento de certos talentos no Brasil é antiga. Mas, creio, sempre pertinente. João Gilberto, por exemplo. Só um tonto de marca maior acredita realmente que o sujeito é uma unanimidade. Sempre que leio uma matéria sobre João na internet, vou lá no pé da página, em busca dos comentários dos leitores. É uma tragicomédia sem fim, um monte de idiotas babando ressentimento.

Sempre que falo de João Gilberto, me lembro de uma matéria que escrevi da última vez em que ele veio tocar no Rio. Entrevistar o sujeito, claro, era impossível. Fui, então, atrás de gente que o conhecia -- Miúcha, João Donato, Daniel Jobim, Roberto Menescal, Moogie Canazio, Ruy Castro, Carlos Lyra, Elba Ramalho (você ainda não era o assessor), Bebel Gilberto (que não me atendeu), Caetano Veloso (idem)... Um dos melhores papos foi com o porteiro do prédio onde ele mora. Me deu uma boa ideia da simplicidade do homem por trás do artista, em que pesem as manias. Enquanto eu conversava com o porteiro, João saiu de carro pela garagem. Daria para correr escada abaixo e tentar trocar duas palavras com o mito, mas o porteiro só soube -- logo, só me avisou -- depois que ele já havia saído.

Voltando à vaca fria, me ocorre que o próprio Mario Adnet mereceria um reconhecimento maior por seus trabalhos próprios. Receio que, para o bem e para o mal, ele tenha tido a sua imagem atrelada ao do grande artista (que indubitavelmente ele é) por trás de discos baseados em outros compositores: Gershwin, Jobim, Baden Powell e Moacir. Sem Mario Adnet, eu certamente teria demorado mais para conhecer Moacir Santos, e devo isso a ele, sem dúvida. E, assim como eu, há outros. Mas há um Mario com existência independente, para além de Ouro Negro ou Afrosambajazz, o excelente disco que ele gravou com músicas de Baden.

Veja, por exemplo, o último disco do Mario, O Samba Vai, lançado há pouco. Pode não ser o disco do ano, mas merecia muito mais reconhecimento do que realmente teve na imprensa. E não me refiro a mais estrelas na cotação da crítica, porque isso é uma bobagem. Falo da questão meramente jornalística que é dar atenção a um dos grandes nomes da atual música brasileira, lançando o seu primeiro disco de inéditas, de composições autorais, e cantando, depois de anos se dedicando a obras de outros. Esqueça a música. Antes mesmo dela, há (ou deveria haver) um interesse jornalístico aí. Não?

Wynton Marsalis, em pessoa, ligou para o Mario e convidou-o para tocar no Lincoln Center, que lotou por duas noites. Imagine, toca o seu telefone e alguém fala: "Aguarde um instante, mr. Marsalis vai falar com o senhor." Eu desligaria, achando que é trote. Ivete Sangalo cantou em Nova York. Agora, compare. Não, não quero ter a pretensão de achar que Mario Adnet, um dia, terá o mesmo espaço na mídia que Ivete Sangalo. Acho até que, de certa maneira, é bom que não tenha (podemos desenvolver esse tópico, se quiser). Mas a desproporção é absurda, muito além do que seria esperada. É triste.

Em tempo: aguardo suas impressões sobre Brad Mehldau, que não vi (estava chacoalhando ao som de alguma coisa de disco music numa festa de casamento).

Ave,

Rafael

sábado, 2 de outubro de 2010

Grande Rafael,

Obrigado pelo convite, em primeiro lugar. Vamos dar início à nossa conversa musical. Acho difícil, sinceramente, que o filme de Louis venha, mas poderia vir com a trilha embutida, né? Será que não vai rodar o mundo assim?

Essa história do Ouro Negro, via Marsalis e Adnet no Lincoln Center, lembrou-me o começo da minha história com Moacir Santos, em 2006. Em abril, fui assistir Wagner Tiso, no Canecão, e na mesa eu estava acompanhado de amigos, desconhecidos e - que sorte - Milton Nascimento. Ainda antes do show, no telão, a casa anunciava apresentações dos próximos dias e, entre elas, Moacir Santos com o show Ouro Negro.

Alguém na mesa perguntou a Milton: "Bituca, quem é Moacir Santos?".

Não lembro o que Milton respondeu, mas sei que, dias depois, eu descobriria a música de Moacir justamente pela brilhante voz de Milton em Navegação, no cd idealizado por Adnet e Zé Nogueira. Tudo mudou com aquilo e comprei o que vi pela frente de Moacir.

O tempo passou e alguns meses depois, em julho, lembro de meu pai me ligar falando que Moacir havia subido. Àquela altura, Moacir já estava no meu altar, junto com o próprio Milton e mais Stevie Wonder, Ennio Morricone, Peter Gabriel e outros. E eu só me perguntava: quem era esse Moacir antes? Ninguém conhecia esse artista fenomenal com nome de jogador de futebol? Como isso acontecia? O trabalho de Mario Adnet, Zé Nogueira e os músicos envolvidos para mudar isso foi louvável.

Sei que o papo é batido, de décadas, aquela coisa de vida lá fora e falta de reconhecimento no Brasil, mas é recorrente, não tem jeito. Minha monografia partiu daí e passou por gente como Newton Mendonça. Uma coisa meio dos esquecidos. E foi prazerosa. Mas perdi o concerto no Canecão, com o mestre presente. Lembrar disso, é de matar.

Um grande abraço,

F

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Fernando, meu caro,

Como autor do convite, achei que cabia a mim a tarefa de inaugurar essa troca de correspondências. E começo por uma notícia que vi justamente no seu blog, sobre o filme contando a história da infância do Louis Armstrong. Filme mudo com Wynton Marsalis tocando a trilha sonora. Como alguém não pensou nisso antes?

Pelo que vi no fim do trailer, as datas de exibição foram em agosto. Entrei no site oficial e não achei uma agenda. Mandei um email para o contato que havia disponível no site, perguntando se havia planos para dar continuidade à turnê. Ainda não me responderam, mas não nutro esperanças de que o filme venha para o Brasil. Aliás, me pergunto quando o Wynton Marsalis vem tocar aqui, com ou sem filme. Temos recebido uma turma boa nos últimos tempos -- Irvin Mayfield o mais recente --, mas o hômi não aparece.

Não faz muito tempo, Marsalis levou Mario Adnet para tocar o disco Ouro Negro -- que você tanto gosta -- lá no Lincoln Center. Conversei rapidamente com o Mario para uma matéria que fiz ainda na época em que trabalhava no Globo, e ele me disse que foi uma catarse. Posso calcular. Tivesse nascido lá fora, Moacir Santos teria sido um Duke Ellington, talvez maior do que Duke. Marsalis podia compensar o favor e vir tocar aqui.

Abraço,

Eu