quarta-feira, 22 de junho de 2011

Ralf,

Joshua Redman foi realmente irresistível, como você disse. Fui meio de turista, não sou muito por dentro da carreira dele, apenas do Wish, que peguei recentemente. E achei ótimo. Lá no palco, o cara me conquistou. Primeiro, o formato curioso, sem instrumento harmônico, né? Isso é algo difícil e ousado. Só baixo, a batera e ele, ali no sax. Foi demais. E aquele lance que ele fez mais pro fim do set? Uma espécia de beatbox na palheta do instrumento. Foi deep, como diz Ed Motta. Sem contar a energia dele no palco, se contorcendo, puxando aquelas notas de um lugar que só ele sabe. No fim do show, chega um sms do meu pai - que estava em outro lugar do teatro: por que não deixaram o cara ir ao banheiro antes de entrar no palco? Ha ha.

Wayne foi o que você disse. Acho que saímos com a mesma impressão. Mas teve algo, foi bonito, talvez fique melhor com o tempo, na memória. Como disse lá no Som Imaginário, aquela coisa da música meio suspensa, solta, me deixou também meio suspenso, solto na cadeira, disperso. Em alguns momentos eu me cobrava atenção, como se estivesse numa aula de matemática da quinta série.

Pulando para a segunda noite, sim, Marcus Miller bateu. Sou baixista, bissexto, mas sou, e acho que já falei aqui do dia que descobri o som dele e pirei. Não queria saber de outra coisa. Ver o cara ao vivo foi do cacete. O que foi aquele momento em Jean Pierre? Pulei da cadeira! Aliás, não sabia que aquela melodia tem origem em uma música de ninar tradicional francesa. Miles, espertamente, pegou a melodia e foi em frente. Algo assim. Depois me aprofundarei, mas é interessante.

O tecladista, discreto, tinha uns timbres meio cafonas, 80s, mas gostei disso. Enquanto, no lado esquerdo do palco, aqueles três eram três crianças tocando o terror. Alex Han, Sean Jones e Louis Alvin Cato foram um show à parte dentro da apresentação do Marcus Miller, que, no melhor estilo Miles, soube aproveitar bem o talento dos garotos.

Foi o melhor show pra mim. Você acertou. Mesmo faltando Backyard Ritual, minha favorita do Tutu.

Sharon foi dez. Um furacão. Tina Turner com James Brown. Energia sobrando. Temperatura lá em cima. Voz impecável. Foi isso e muito, mas muito mais. Mesmo assim, cheguei ao fim da apresentação meio cansado daquilo tudo. Já estava meio over nos últimos vinte minutos. E aí vi que aquela intro, que soou enorme, não foi tão divertida como imaginava, o que acabou fazendo com que ficasse, no saldo final, levemente desnecessária. As backings precisavam mesmo de um número solo cada?

Sei lá, não curti.

Mas chega de resmungar. Que venha o BMW Jazz Festival ano que vem. Essa edição foi demais. Uma pena não ter vindo o Tord Gustavsen Trio, que tocou em São Paulo. Vale um youtube.

Não paro de ouvir uma banda chamada Dear Hunter. Olha que interessante a história do Color Spectrum, novo trabalho deles: são 9 EPs, com quatro músicas em cada, e cada um de uma cor, que dita o caminho das músicas. Por exemplo, o preto é meio denso, com umas guitarronas, meio heavy; o laranja puxa para um rock mais 90; o verde é mais folk, cheio de violões; o amarelo pega a onda dos Beach Boys; o violeta é meio musical, pomposo, com cordas. E por aí vai. Criativo e bonito.

Fico por aqui.

Bom feriado.

Abração,

Neuma

sábado, 18 de junho de 2011

F.,

Direto ao ponto, desenvolvendo um pouco aquilo que falamos pessoalmente ou por Gtalk ao longo da semana: valeu muito a edição carioca do BMW Jazz Festival. Mas vamos por partes.

Na primeira noite, Joshua Redman se comunicou mais comigo -- e, a julgar pelas reações da plateia e pelo que li na imprensa, foi assim com a maioria. O baixista, Reuben Rogers, era de primeira linha, mas quem me chamou a atenção mesmo foi o baterista, Gregory Hutchinson, meio Art Blakey, guardadas as devidas proporções. Me agradou o formato enxuto, a seleção dos temas, indo de um certo orientalismo -- ouça de novo Ghost -- a um post-bop mais enérgico -- East of the Sun (And West of the Moon) --, os instrumentos se entrecruzando às vezes de maneira intrigante, com andamentos descolados, mas tudo muito atraente, irresistível, sem causar a menor rejeição. 

Rejeição, aliás, foi o que eu vi em boa parte do público durante a apresentação do Wayne Shorter. Hordas de pessoas indo embora. É aquilo que já te falei: ambos são letais em suas respectivas artes, mas enquanto Redman é um ninja, Shorter é um samurai. Exige adesão, entrega do público. Não é um cara que te pega pela mão. Quando embarquei na onda, percebi beleza genuína, uma expressividade original, uma imersão das mais profundas na música em seu sentido mais amplo. Mas, às vezes, apesar disso, os temas eram meio longos demais para mim, e confesso que perdi o fio da meada em alguns momentos. Não que eu ache que seja culpa do público, aquela reverência meio babaca de que "você está diante da arte mais sofisticada e não alcançou porque é um idiota". Comunicação é um exercício de parte a parte (o show de Marcus Miller, na noite seguinte, é prova incontestável disso). Mas há críticas que acho tolas. Por exemplo, aquela que diz que ele não sopra como antigamente. Pombas, o cara é um octogenário! Não deve correr, subir escada ou trepar como antigamente. Por que deveria soprar? Ouvi essa mesma bobagem depois de um show do Sonny Rollins, em idade igualmente avançada, numa das edições do finado TIM Festival. Dá vontade de bater.

No dia seguinte, Marcus Miller, que foi aquilo que todo mundo viu -- e vou deixar para você falar, já que, suspeito, deva ter sido o melhor show dos quatro, na sua opinião.

E Sharon Jones, avassaladora. Difícil comentar algo que já não tenha sido falado, mas devo dizer que eu achei ainda melhor do que esperava. Você disse que, mesmo tendo achado o show ótimo, te cansou um pouco a mesma fórmula repetida por duas horas. Entendo, mas não tive a mesma sensação. Pelo contrário, aceitaria mais algumas doses. Imagino que tenha sido porque assisti em pé, dançando, enquanto você estava na poltrona. Faz diferença. É um show dançante, acima de tudo -- o que foi dito pelo guitarrista ali na introdução, antes que a cantora entrasse no palco. Imagine aquilo no Circo Voador, num sábado à noite, todo mundo com uma cervejinha na mão. Deu pena da Amy, cara.

Depois disso tudo, quase esqueci da sua pergunta da carta passada, sobre o Queen. Sim, gosto -- já escutei bem mais, mas continuo gostando. Há quem não goste? Gente mais infeliz.

Bração,

R.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Tex,

Passando rapidamente para não deixar sua carta pra trás.

Começo concordando com duas coisas: a superexposição da Gadu cansou (muito) a imagem e a música dela; e a Sharon Jones faz soul e é isso, como você disse.

Essa coisa de música no repeat é ótima. Tenho muito. A dessa semana é Girl, You'll Be a Woman Soon, do Neil Diamond, na versão da trilha do Pulp Fiction, com o grupo Urge Overkill. E é exatamente o que você disse - concordando novamente: a música não precisa ser a oitava maravilha do mundo, basta ter isso que nos faz deixá-la no loop. É inexplicável.

Tumbling Dice, dos Stones, foi outra que ficou dias quando descobri.

Estou naquela época de ouvir pouca coisa nacional, tenho caminhado pelas trilhas do John Williams; também pesquei Speak No Evil, do Wayne Shorter, que você deve ter coisa pra falar; e, dos nossos, ontem fui até Bethânia cantando Robertão. Me amarro nesse disco. Tem um repertório impecável, ótimos arranjos e talvez a minha voz favorita das cantoras brasileiras. Uma amiga me mostrou uns cantores italianos cantando Roberto e era coisa fina. Depois pego os nomes.

Bati aquele papo com Ed Motta e foi ótimo. Falamos um pouco da pauta que me levou lá na casa dele - Billy Harper, por conta do BMW Jazz Festival - e depois saímos por outros assuntos como Ennio Morricone, Moacir Santos, Led Zeppelin. Preferidos que temos em comum. E também coisas que ele não gosta, como Rush e Queen, para citar dois. O primeiro já falamos aqui. E o segundo? Freddie Mercury - opa, pera aí - te fisga?

E, sim, a coleção do cara é uma coisa mega!

Abração,

Éfe Neumayer

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Neumayer,

Começando pelo fim: Bizarre Love Triangle é uma daquelas músicas que eu seria capaz de ouvir indefinidamente, no repeat. É engraçado, porque isso não significa que essas músicas sejam necessariamente boas. Muitas vezes são, mas não é disso que se trata -- elas simplesmente entram fácil no meu ouvido, sem enjoar. Crazy, do Gnarls Barkley, é outra. Head Over Heels, do Go-Go's (que, aliás, estou escutando neste exato momento), também. Don't You (Forget About Me), do Simple Minds, outra. Você vai achar estranho, mas What's My Name, do Snoop Dogg, é outra. Cantaloupe Island, do Herbie Hancock (que gerou Cantaloop (Flip Fantasia), do US3), idem. E há mais...

Herbie Hancock, aliás, não sei se já te contei, foi um dos points of no return para a minha entrada no mundo do jazz. Eu era moleque, e adorava -- como todo mundo -- quando tocava Cantaloop (Flip Fantasia) nas festinhas. Achava a música duca. Um belo dia, estava eu numa festa no Iate Clube. Na área externa, longe da pista, tinha um bar e um telão onde passavam uns clipes. Não me pergunte porque diabos fizeram isso numa festinha de adolescentes, mas o que eu sei é que, de repente, entrou um clipe do Herbie Hancock tocando Cantaloupe Island. Bicho, foi uma iluminação. Inicialmente, eu não entendi muito bem, fiquei confuso com relação a quem teria chupado a ideia de quem. Quando a ficha caiu, eu já estava fisgado.

Dois discos rodaram aqui em casa por esses dias. Um bem bonito, do Chico Adnet (irmão do Mario, pai do Marcelo), chamado Alma do Brasil. Merece mais audições antes que eu fale qualquer coisa. E o outro foi o registro do show de Caetano Veloso e Maria Gadú, que tem seus momentos. O primeiro CD (o disco é duplo) é indiscutivelmente melhor, com eles em duo desbravando um pouco de um repertório ao qual Caetano há muito não voltava -- O Quereres, Rapte-me Camaleoa, Vaca Profana... No segundo CD, principalmente na parte em que Maria Gadú canta sozinha, a peteca cai. Tenho a impressão de que é efeito da superexposição. De fato, a moça começa a cansar -- se é que já não cansou. Um único álbum de estúdio e sei lá quantos CDs e DVDs ao vivo, fora as participações em trabalhos de outros...

Só pra não deixar sem registro, Paul McCartney foi incrível, de novo. E, desta vez, sendo o Engenhão bem menor do que o Morumbi, deu pra ver mais de perto. O fato de ter sido a segunda dose foi bom para ter uma noção melhor do show como um todo, observar os músicos e tal. E concordo contigo: essa turma que diz que a banda é só o.k. talvez diga que Ringo é um baterista apenas correto. Releve, releve.

E o BMW, hein? Tô animado, principalmente com Sharon Jones -- que, aliás, deu uma entrevista acho que pra Rolling Stone, dizendo que não faz parte desse revival do soul. Teve gente que achou meio arrogante, mas eu entendo o que ela quer dizer. Pombas, ela não é dessa geração nova que revisita a soul music. O que ela faz é a própria soul music. Não acha?

Aliás, isso me remete a Amy Winehouse, que, pelo que li, já finalizou o terceiro disco. Mas o povo da gravadora não quer lançar enquanto ela não termina a rehab. Aguardamos ansiosamente.

Ouvi o Jamie Woon, e achei, sei lá... comme cicomme ça.

Vamos que vamos.

Bração,

R.